“O Crime da Aldeia Velha” – Bernardo Santareno

Esta peça de teatro baseia-se em factos reais que ocorreram na aldeia de Soalhães, em 1934. Uma jovem, acusada de práticas de bruxaria, foi queimada viva pela população local, razão pela qual a aldeia ficou conhecida como "Terra do Mata e Queima".

Em "O Crime da Aldeia Velha", acompanhamos o desenrolar do drama de Joana, uma rapariga bela que atrai os amores dos rapazes da aldeia e se diverte a manipulá-los. A desconfiança dos habitantes da terra, de que já antes fora alvo a sua mãe, é exacerbada pela morte de dois jovens, numa luta decorrente das provocações de Joana. Depois da morte de um bebé que se seguiu ao seu contacto com Joana e da alteração drástica de comportamentos de mais um rapaz apaixonado por ela, os burburinhos acerca do demónio que a teria possuído sobem de tom. A própria Joana começa a acreditar que traz o diabo no corpo, ainda que o pároco local insista que não é, de todo, disso que se trata. Mas a população vê esta benevolência como a prova de que também o pároco foi vítima do demónio na rapariga e decide tomar as medidas necessárias: exorcizar o diabo em Joana através do fogo purificador.

Bernardo Santareno triunfa, mais uma vez, na representação microscópica da vida em povoações pequenas no início do século passado. A expressividade dos diálogos, numa linguagem que em tudo se assemelha ao registo oral aldeão, deixa transparecer a moldura mental das personagens que povoam a peça – uma moldura mental de desconfiança, intriguismo e profunda religiosidade.

Contrariamente ao que acontece com a maioria das peças de teatro que já tive oportunidade de ler, não senti que "O Crime da Aldeia Velha" precisasse de ser visto em palco para ser plenamente apreciado. As didascálias são muito claras e expressivas, de modo que este texto dramático pode ler-se quase como se se tratasse de um texto narrativo.

Em suma, esta é uma peça de leitura fácil e cativante, uma adaptação bem conseguida de acontecimentos reais e uma representação perturbadora das consequências mais radicais da ignorância e da superstição.

© 2020 Helena Rodrigues, Portugal
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