Canção de embalar
Repousa, joia, o sol de amanhã tarda,
Desfruta dos braços do anjo da guarda,
Um dia, verás a bênção que tinhas.
Crescer é ler sombras nas entrelinhas.
Descansa, pequena, antes que descubras
Que esta vida é um rio de águas turvas
E que os piores monstros desta trama
Não são os que estão debaixo da cama.
Dorme criança, um sono imaculado,
Livre da rude mancha do pecado,
Sem tentação de ir por portas travessas.
Contos de fadas são letras impressas.
Sonha, petiz, ao fel da inveja alheia,
Aos grupos de alma velha e cara feia
Que olham e riem e riem e rondam
E esperam de ti o que eles não foram.
Não temas, cria, ainda és dona do tempo.
Sem pressa, as Parcas guardam-te o assento.
Quando saíres do torpor profundo,
Voa tão alto que não vejas fundo
E não duvides um segundo
Que o mundo é teu.