"porque escrevo e outros ensaios" - George Orwell
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Nesta coletânea de ensaios de George Orwell (pseudónimo de Eric A. Blair), é reunida uma série de textos que abordam alguns dos temas mais presentes na atividade crítica do autor: a escrita, os totalitarismos, a manipulação da verdade e o estado do socialismo na antiquada sociedade britânica. Passo a resumir os meus preferidos:
Em Porque Escrevo, Orwell perceciona a produção escrita como o resultado de quatro motivos, conjugados nas mais diversas proporções: o egoísmo do escritor, o entusiasmo estético, o impulso histórico e o propósito político. Do ponto de vista de Orwell, são as obras dotadas de um propósito mais profundo, com uma mensagem verdadeiramente crítica, as de maior valor no universo literário: "E, olhando para o meu trabalho, vejo que foi, invariavelmente, quando não tive um propósito político, que escrevi livros sem vida, caindo em passagens empoladas, frases sem significado, adjetivos decorativos e treta em geral."
Em Verdade Histórica, o autor sublinha a parcialidade da História, que a liberdade de expressão não consegue alterar. Permanentemente preocupado com a tendência humana para distorcer a verdade, Orwell questiona-se acerca da noção da História que teríamos, se os vencedores tivessem sido outros e tivessem sido ouvidas mais versões dos mesmos acontecimentos.
Firme na sua oposição ao totalitarismo e consciente dos seus efeitos na esfera cultural da sociedade, em Literatura e Totalitarismo, Orwell reflete acerca do risco a que a criação literária se sujeitaria com o triunfo dos regimes totalitários. Enquanto a literatura moderna se baseia na honestidade intelectual, o totalitarismo abole a liberdade de pensamento e exige a adoção de um código mental isolado do mundo exterior, que se altera consoante a necessidade política do poder e que impossibilita a criação de boa literatura: "O que há de realmente assustador no totalitarismo não é o cometer de «atrocidades», mas o ataque ao conceito de verdade objetiva, ao afirmar que controla o passado como controla o futuro."
Já Um Enforcamento, assinado por Eric A. Blair, recua até aos seus tempos de Polícia Imperial na Birmânia inglesa e descreve com precisão um enforcamento a que assistiu, sublinhando a insensibilidade dos homens perante um ato tão cruel.
Apesar de não costumar ler não-ficção, seria impensável perder uma oportunidade de ver o mundo da perspetiva de Orwell, com toda a sua clareza de pensamento e o vigor do seu espírito crítico. Independentemente da tendência socialista do autor, o que mais me fascina nele é a sua posição invariavelmente anti-totalitarista, carregada de bom-senso.
Orwell, que era, como já referi, um apologista da verdade, consegue retratar a complexidade do contexto político e social em que se insere com uma simplicidade que permite a qualquer leitor compreender o seu discurso. Por isso, ler os seus textos abre-nos as portas para os meados do século XX e para as questões com que a Europa se debatia nessa época, abordadas de uma forma que nos envolve nas reflexões do autor.
Tendo em conta a sociedade dos nossos dias, dominada pela superficialidade e pela demagogia, e em que o conceito de fascismo passa de boca em boca, a leitura desta coletânea é de especial importância.
escrevo porque há uma mentira qualquer que quero denunciar, um facto qualquer para o qual quero chamar a atenção, e a minha preocupação inicial é ser ouvido »
Não é provável que o homem salve a civilização, a não ser que possa desenvolver um sistema de bem e mal que seja independente do Céu e do Inferno. »