Salomé

Só, raquítica, envelhece, 

Dos tempos idos refém 

De ecos de risos, além, 

Que a memória desvanece. 


Qual beata numa prece, 

Cânone de amor de mãe, 

Cozinha p'ra dois, p'ra cem, 

Como o seu anjo merece. 


Sobre o rumor do vaivém, 

Um ranger que reconhece: 

O seu neto as escadas desce, 

Companhia que convém. 


Num alento, quase esquece 

Qual o dia, quem é quem. 

Rente ao halo de ninguém, 

O seu semblante escurece. 


Junto à mesa se detém. 

Em frente, a sopa arrefece. 

Sorri, mudo, e agradece 

O neto que já não tem.

© 2020 Helena Rodrigues, Portugal
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